O ex-reitor interventor da Universidade Federal do Vale do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), Janir Alves Soares, foi punido pela Comissão de Ética Pessoal (CEP) da Presidência da República. A censura ética foi aplicada ao docente por “desvio ético decorrente de ilícitos eleitorais, manifestação político-partidária em rede social às vésperas de eleição, participação posterior em bloqueio de estrada, em protesto contra o resultado da referida eleição”.
A instauração do processo a apuração ética decorreu de representações da Associação dos Docentes da UFVJM (Adufvjm Seção Sindical do ANDES-SN) e do Sindicato de Trabalhadores nas Instituições Federais de Ensino Sindifes, encaminhadas à CEP pelo Conselho Universitário da UFVJM. Para Mario Mariano Ruiz Cardoso, 1º vice-presidente da Regional Leste do ANDES-SN e docente da UFVJM, a punição ao ex-reitor interventor é uma pequena vitória fruto da luta de docentes, técnicos, técnicas, estudantes e movimentos sociais que defendem uma Universidade radicalmente democrática.
“Durante a intervenção, servidoras e servidores adoeceram, estudantes abandonaram seus estudos e o clima era de perseguição a quem lutava. O sindicato foi fundamental na resistência. Entretanto, as consequências desse período ainda persistem na UFVJM e em muitas outras instituições de ensino superior em que a autonomia é cotidianamente ameaçada pelo projeto do capital. Nesse momento, por exemplo, os empresários do Lítio querem dar continuidade a parceria com a UFVJM iniciadas durante a intervenção. O capital quer ditar os rumos da nossa universidade colocando a serviço da lógica da Mineração destrutiva. Isso também é intervenção e, por isso, a vitória contra o interventor deve nos animar a dar continuidade à organização de trabalhadoras, trabalhadores e estudantes”, afirmou o diretor do ANDES-SN.
Parecer da CEP
De acordo com parecer da CEP, emitido em 23 de setembro, as ações do ex-reitor da UVFM feriram o artigo 3º do Código de Conduta da Alta Administração Federal. Segundo o parecer da Comissão, Janir Alves Soares, em vídeo divulgado às vésperas da eleição de 2022, “’formulou observações alusivas às eleições presidenciais de 2022 e promoveu propaganda política negativa do partido de oposição da época, o Partido dos Trabalhadores - PT, ao declarar que ‘o caminho para consolidar [...] não é o retorno do governo que teve dezesseis anos para mostrar pra que veio’ ; ‘durante o governo do PT instaurou-se a cleptocracia no país’; e ‘a mensagem que eu retrato aqui acerca dos governos de 2003 a 2018 para a UFVJM [... ] ele deixou um lado da história caracterizado por fragilidades na gestão e governança, isto está muito bem caracterizado’”.
Foi constatado ainda que o ex-reitor interventor “utilizou-se do cargo que ocupava para endossar suas manifestações de cunho político-partidário, ao afirmar: ‘Mas é muito importante eu como reitor de uma instituição, de uma universidade federal, mostrar essas realidades para as senhoras e para os senhores, principalmente nesse momento de tomada de decisão’”.
Ainda conforme o parecer, Soares “teria exaltado governo federal da época, mencionando projetos que diferentes ministérios estariam desenvolvendo no âmbito da UFVJM. Em verdade, essa alusão ressoou como um pedido de voto implícito ao então Presidente da República e candidato à reeleição, Jair Messias Bolsonaro”.
Além disso, em 1º de novembro de 2022, após derrota de Bolsonaro para Lula nas urnas, Janir realizou bloqueio da rodovia BR-367 e, em correspondência enviada à Polícia Militar de Minas Gerais - PMMG, o ex-reitor interventor contestou o resultado das eleições presidenciais e teceu “críticas ao candidato da oposição, então vitorioso, com total falta de decoro e urbanidade, ao se declarar apoiador de ‘movimento nacional pela intervenção federal, contra a posse de um ladrão, descondenado e corrupto’ e manifestar ‘reprovação aos resultados desta eleição presidencial’”. Confira aqui a íntegra do parecer.
Essa não foi a primeira censura ética imposta pelo CEP à Janir Alves Soares. Em abril, o ex-reitor interventor já havia recebido uma sanção devido a retirada arbitrária e desrespeitosa de servidor da UFVJM de evento da instituição. Acesse aqui.
Censura Ética
A censura ética é uma penalidade que pode ser aplicada a servidores públicos por infrações ao Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal. Conforme o Código de Conduta da Alta Administração Federal (CCAAF), a censura ética é aplicável às autoridades que já tiverem deixado o cargo.
A punição é registrada nos assentamentos funcionais do servidor, por até três anos, o registro da censura, para que, em eventuais consultas, o serviço de Gestão de Pessoas tenha ciência da punição que o servidor recebeu, para o efeito de instruir e fundamentar promoções e outros procedimentos próprios da carreira do servidor.
Intervenção e autoritarismo na UFVJM
De agosto de 2019 a agosto de 2023, a Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri esteve sob a administração do interventor Janir Alves Soares. Empossado por Jair Bolsonaro, Soares não teve sequer 6% dos votos da comunidade acadêmica.
Além de fazer uso uso da máquina pública para fazer campanha para Jair Bolsonaro e ter coordenado bloqueios de rodovias na região de Diamantina (MG), não respeitando o resultado das eleições no país, a gestão do ex-reitor na UFVJM foi marcada pelo autoritarismo, por perseguições à comunidade universitária, pelo esvaziamento dos conselhos superiores e órgãos colegiados, além do não cumprimento das decisões do Conselho Superior. O interventor também adotou medidas privatistas, como a tentativa de avançar na venda de serviços dentro da universidade e a ampliação do Ensino a Distância (EAD).