O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão das operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia do novo coronavírus. A decisão liminar, de caráter provisório, saiu na última sexta-feira (5), após as intensas manifestações decorrentes do assassinato brutal de George Floyd por policiais nos Estados Unidos. Aqui no Brasil, somado a morte de Floyd, os assassinatos de pessoas negras pela polícia colocaram a pauta antirraticista no centro das lutas sociais.
Apesar da proibição, a decisão do ministro permite operações somente em "hipóteses absolutamente excepcionais", sem exemplificar quais seriam. Nesses casos, seriam necessárias justificativas por escrito pela autoridade competente, com a comunicação imediata ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. O órgão é o responsável pelo controle externo da atividade policial.
De acordo com Fachin, nesses casos, deverão ser adotados cuidados para não colocar em risco ainda maior a população, a prestação de serviços públicos sanitários e o desempenho de atividades de ajuda humanitária. O texto prevê também a responsabilização civil e criminal em caso de descumprimento a gestores e governador.
“Foi necessária toda uma comoção pública e uma pressão social denunciando o racismo e exigindo do Estado ações antirracistas para que essa decisão fosse proferida. Essas operações no contexto da pandemia são ainda mais absurdas, pois ampliam o genocídio da população pobre e negra das periferias e favelas”, disse Mariana Trotta, encarregada de Assuntos Jurídicos do ANDES-SN.
Em sua decisão, o ministro citou que os fatos recentes tornam ainda mais preocupantes as notícias sobre a atuação armada do Estado nas comunidades fluminenses. Ele cita o caso do menino João Pedro, de 14 anos, morto a tiros dentro de casa em operação conjunta das polícias Federal e Civil no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, região metropolitana do Rio, no dia 18 de maio. A operação contou com veículos blindados e aeronaves. Uma perícia na casa onde João Pedro foi baleado encontrou cerca de 70 marcas de tiros no local.
Descumprimento da liminar
Um dia depois da decisão liminar do STF proibir a realização de operações policiais sem motivo excepcional em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia, moradores do Complexo do Alemão, na zona norte da capital, relataram ouvir um tiroteio na noite do sábado (6) durante uma incursão policial na região. De acordo com eles, os tiros foram ouvidos na comunidade da Grota por volta das 19h. Imagens da operação, publicadas pelo jornal Voz das Comunidades nas redes sociais, mostram ao menos três viaturas da Polícia Militar na localidade.
Para Mariana Trotta, é necessário uma pressão popular para cobrar o fim das operações nas comunidades. “É necessário continuar nessa mobilização, nessa pressão social, denunciando o racismo, fazendo a luta antirracista que aqui no Brasil tem sido feito pelo movimento Vidas Negras Importam, com o apoio de diversos movimentos e sindicatos, para que haja uma compreensão do STF e do governador que não deve existir excepcionalidade”.
ADPF
A decisão do STF foi tomada na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, em que o Partido Socialista Brasileiro (PSB) questiona a política de segurança pública do governador Wilson Witzel (PSC), que, segundo a legenda, estimula o conflito armado e “expõe os moradores de áreas conflagradas a profundas violações de seus direitos fundamentais”.
A ADPF foi submetida ao Plenário Virtual do STF, mas o julgamento está suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. Por isso, o ministro Fachin restringiu sua decisão à determinação de paralisação das operações policiais. “O pedido de medida cautelar, tal como formulado na inicial, será, a tempo e modo, apreciado pelo colegiado”, afirmou o relator.
*Com informações do STF