Funai retira proteção de terras indígenas não homologadas

Publicado em 11 de Janeiro de 2022 às 18h17. Atualizado em 12 de Janeiro de 2022 às 12h28
TI Ituna/Itatá (PA) é uma das terras indígenas que pode ficar desprotegida pela Funai. A TI vem sofrendo forte atuação de invasores e foi uma das mais desmatadas entre 2020 e 2021. Foto: Fábio Nascimento/Greenpeace

As terras indígenas não homologadas foram excluídas dos planos de proteção territorial da Fundação Nacional do Índio (Funai). A medida foi determinada por meio de um ofício circular no dia 29 de dezembro de 2021, expedido pelo coordenador de Monitoramento Territorial da Funai, Alcir Amaral Teixeira, após uma consulta da Diretoria de Proteção Territorial (DPT) à Procuradoria Especializada do órgão indigenista.

Para o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a exclusão afronta a Constituição Federal e as leis que tratam da proteção dos povos indígenas e suas terras, vulnerabilizando ainda mais essa parcela da população que sofre cotidianamente com a invasão e destruição de seus territórios.

Além de excluir as terras indígenas não homologadas dos planos de proteção territorial, o ofício da Funai determina que informações sobre crimes ambientais em terras indígenas não homologadas que cheguem ao conhecimento das Coordenações Regionais da Funai “devem ser formalmente encaminhadas aos órgãos competentes”, como Polícia Federal, Ibama e secretarias estaduais do meio ambiente.

No caso de crimes contra comunidades ou indígenas que habitam essas terras, a orientação é para que as coordenações apenas repassem as denúncias às Polícias Civil, Militar e Federal, não prevendo medidas administrativas ou judiciais voltadas à proteção dos povos indígenas. A única exceção para essas determinações é no caso de terras indígenas cuja proteção é garantida por meio de ordem judicial.

Terras afetadas
Na prática, segundo dados do relatório “Violência contra os povos indígenas do Brasil – dados de 2020”, do Cimi, a medida deixará sem proteção pelo menos 282 terras indígenas que se encontram em diferentes fases do processo de demarcação. Torna também mais vulneráveis as comunidades de 536 terras indígenas que ainda não tiveram providências do Estado para seu reconhecimento. Entre as áreas afetadas estão, inclusive, 14 terras indígenas com portarias de restrição devido à presença de povos em isolamento voluntário.

De acordo com a entidade indigenista, a medida “escancara mais uma vez o afastamento da atual gestão do governo federal de suas atribuições constitucionais na proteção dos direitos indígenas”. O Cimi ressalta que a proteção garantida pela Constituição Federal aos territórios indígenas não se restringe apenas às terras homologadas, mas “a todos os territórios ocupados por comunidades indígenas no país, homologados ou não”.

O Conselho Indigienista Missionário aponta ainda que, além da Constituição, instrumentos legais anteriores à Carta Magna, como o Estatuto do Índio e a lei de criação da própria Funai, garantem a proteção a todos os territórios indígenas, independentemente da fase em que se encontra seu procedimento administrativo de demarcação. Essa posição já foi reafirmada em diversas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e, inclusive, em manifestação recente do Procurador-Geral da República (PGR), Augusto Aras, no julgamento de repercussão geral sobre a demarcação de terras indígenas.

“Nossa Corte Constitucional em diversas oportunidades se manifestou no sentido de que não é da conclusão de processo de demarcação que advém o dever de proteção aos direitos indígenas, pois o procedimento demarcatório não constitui terra indígena, mas apenas reconhece a existência de posse tradicional preexistente, tratando-se de ato meramente declaratório”, afirma.

Para a entidade, a conduta temerária e recorrente da atual gestão da Funai pode se enquadrar em possíveis atos de improbidade administrativa. “O órgão indigenista não pode se furtar de cumprir com as suas atribuições legais, muito menos dar interpretação restritiva à Constituição Federal e leis ordinárias que fixam seus deveres institucionais”, acrescenta a nota técnica do Cimi. 

Confira aqui na íntegra.

Fonte: Cimi, com edição do ANDES-SN
 

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