‘Novo’ Ensino Médio começa a ser implementado a partir de 2022

Publicado em 03 de Agosto de 2021 às 17h21
Reforma do Ensino Médio foi aprovada sob protestos em 2017, no governo Temer. Foto: Junior Silgueiro/Seduc-MT

O Ministério da Educação anunciou que o chamado Novo Ensino Médio, aprovado em 2017, será implementado nas escolas públicas e privadas do país a partir de 2022. As ações e o cronograma nacional para a efetivação da contrarreforma do Ensino Médio foram divulgados pela pasta. A nova modalidade será realizada de forma progressiva com as 1ª séries do Ensino Médio no próximo ano. Em 2023, com as 1ª e 2ª séries e completando o ciclo de implementação nas três séries do ensino médio em 2024.

O novo modelo é fruto da Medida Provisória (MP) 746/2016, que foi convertida em lei (13.415/2017) em menos de seis meses.  A lei alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB nº 9394/96) e estabeleceu uma mudança na estrutura do ensino médio.  Embora o governo propagandeie que o ensino será em tempo integral, o aumento da carga horária mínima dos estudantes, das atuais 800 horas para 1.000 horas anuais, será de apenas uma hora/aula por dia, o que não configura uma perspectiva de oferta de ensino em tempo integral. A carga horária será dividida entre os componentes curriculares da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e os itinerários formativos, incluindo a formação técnica e profissional, voltados ao mercado de trabalho.

A Lei, aprovada à revelia da sociedade, gerou movimentos de protestos e ocupações por parte de estudantes secundaristas e universitários em mais de mil escolas em todo o país, apoiados por trabalhadores e trabalhadoras da educação e pela comunidade em geral. “Era evidente a necessidade de mudanças no ensino médio, diante da precarização desse nível de ensino, sobretudo, e especialmente para a classe trabalhadora. No entanto, essa é uma mudança apresentada como técnica e que não considerou o aprofundamento do debate com a sociedade. Nem mesmo os projetos que tramitavam no Parlamento federal, relacionados ao tema, foram considerados”, avalia Neila de Souza, da coordenação do Grupo de Trabalho de Política Educacional (GTPE) do ANDES-SN.

Conteúdos
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do ensino médio, aprovada em 2018, orienta os currículos dos sistemas e redes de ensino dos estados e as propostas pedagógicas de escolas públicas e privadas em todo o Brasil. Antes da BNCC, as disciplinas listadas por lei como obrigatórias nos três anos do ensino médio eram português, matemática, artes, educação física, filosofia e sociologia. Agora, apenas as disciplinas de língua portuguesa e matemática são obrigatórias para os três anos do ensino médio.

As aprendizagens definidas na BNCC do Ensino Médio estão organizadas por áreas do conhecimento (Linguagens e suas Tecnologias, Matemática e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias, Ciências Humanas e Sociais Aplicadas).  A outra parte do ensino será através dos cinco itinerários formativos, uma espécie de especialização dentro de uma das áreas do conhecimento ou ensino técnico profissionalizante. Segundo o MEC, as e os estudantes poderão “escolher” em qual área querem aprofundar seus conhecimentos ao longo do ensino médio: linguagens e suas tecnologias, matemática e suas tecnologias, ciências da natureza e suas tecnologias e ciências humanas e sociais aplicadas e formação técnica e profissional. 

Segundo a coordenadora do GTPE, desenvolver a autonomia das e dos estudantes é uma das funções da escola. Entretanto, as mudanças estritas apenas aos conteúdos, como proposto pela lei, não promoverão uma educação emancipadora. “As escolas não dispõem de capacidade para oferecer o que pode ser demandado pelos jovens quando se diz que o estudante escolherá seu percurso formativo. Está documentado, mas na propaganda não diz que a escola pode oferecer os percursos formativos, de acordo com suas possibilidades. Além disso, mesmo com as possibilidades de escolhas, se forem oferecidas pelas escolas, em que condições os alunos realizarão essas escolhas?”, questiona.

Neila aponta, ainda, que a lei permite a contratação de professores e professoras sem diploma em licenciatura para dar aulas em disciplinas da parte técnica e profissionalizante, entre outras mudanças. A lei 13.415/17, que altera o artigo 61 da LDB, admite a figura de “profissionais com notório saber” nos respectivos sistemas de ensino, desqualificando os cursos de Licenciatura e desconsiderando a profissão, que tem regulamentação e que deve ser exercida por quem tem formação específica, o que inclui domínio do conteúdo e formação pedagógica.

“A quem serve o notório saber? É mais uma vez a possibilidade de os empresários se inserirem nas escolas públicas, além dos concursos para professores, já tão escassos, não serem mais necessários, pois alia-se tudo isso às Organizações Sociais (OS), que poderão realizar as contratações para as escolas, com contratos realizados via Secretarias de Educação”, denuncia.

“E, por ocasião da contratação de docentes, em um cenário com duas opções, de uma professora ou professor com formação e outro sem formação, quem exigirá, por exemplo, condições de trabalho e, ou mesmo, salário? É fácil ter a resposta de quem a OS contratará. Pois essas organizações não estão preocupadas, por exemplo, com a formação crítica que conduza à emancipação dos estudantes”, completa a docente.

Empréstimo
Para viabilizar a contrarreforma do Ensino Médio, em 2017, o Ministério da Educação iniciou as negociações para um empréstimo com o Banco Mundial, no valor de 250 mil dólares. Para receber o dinheiro, o governo brasileiro precisaria cumprir uma série de metas previstas no acordo e relacionadas à implementação da reforma.

Dentre as metas já alcançadas estão a identificação de 27 especialistas para auxiliar os estados na implementação da reforma, a realização de formações sobre a elaboração dos novos currículos e prestação de assistência técnica aos estados para melhorar a execução dos recursos do Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI), criado no final de 2016 pela pasta – e que também conta com recursos do Banco Mundial para ser realizado.  No plano original, entre 2018 e 2020, seria desembolsado 174,5 milhões de dólares, mas até o momento foram liberados apenas 52 milhões – a maior parte ainda em 2018.

“O dinheiro será emprestado a juros exorbitantes e a população brasileira talvez tenha que se sacrificar, seja para manter seus empregos e ou mesmo para suprir as necessidades básicas, de alimentar-se, de ter um prato de comida por dia. Grande parte dessa população, inclusive as e os docentes que estão na ponta, não têm a dimensão de que estão a serviço de cumprir políticas que visam apenas o lucro dos grandes capitais, entre eles dos banqueiros, tudo com a anuência dos governantes”, alertou Neila.

Em novembro de 2017, o Banco Mundial afirmou que o governo brasileiro gasta mais do que arrecada e aloca seus recursos de maneira pouco eficiente, segundo o relatório “Um ajuste justo: Análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil”. O banco “sugeria” ao país reduzir seu investimento em Educação – e também o número de professores e professoras. “O que faz uma instituição financeira internacional no meio de um debate sobre uma lei da educação brasileira?”, questiona a coordenadora. “O Banco Mundial passa de 'emprestador' de dinheiro a 'reformulador' de políticas educacionais”, completa.

Posicionamento do ANDES-SN
A proposta de contrarreforma do ensino médio foi alvo de profunda crítica e mobilização pela comunidade escolar, inclusive pelo ANDES-SN, que desde 2016 é contrário à BNCC e à reforma do Ensino Médio, com decisões congressuais, notas de repúdio e várias publicações sobre os ataques à Educação Pública, como forma de municiar a categoria e toda a sociedade para o debate e enfrentamento. Confira algumas abaixo:

A Contrarreforma do Ensino Médio: o caráter excludente, pragmático e imediatista da Lei n° 13.415/2017

Projeto do Capital para a Educação: Análise e ações para a Luta Vol. 2, que aborda a proposta de desmonte da Educação Pública do Banco Mundial

Projeto do Capital para a Educação: Análise e ações para a Luta Vol. 3, que traz um capítulo sobre o papel das OS como instrumento de ofensiva neoliberal contra a Educação Pública

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